sábado, 15 de outubro de 2011

A Mensagem da Reforma para os Dias de Hoje (parte 1)


por F. Solano Portela Neto

I. POR QUE LEMBRAR A REFORMA?
Em 31 de outubro de 1517, Martinho Lutero pregou as suas hoje famosas 95 Teses na porta da catedral de Wittenberg. Periodicamente as igrejas evangélicas relembram aqueles eventos que, na soberana providência de Deus, preservaram viva a Sua Igreja. Muitos, entretanto, questionam essas comemorações e alguns chegam até a contestar a lembrança da Reforma. "Por que considerar o que aconteceu há quase 500 anos?"

Seguramente, muitos não estudam a Reforma por mero desconhecimento do fato, por falta de informação ou por não se aperceberem da sua importância na vida da Igreja e da humanidade. Outros há que procuram um esquecimento voluntário daqueles eventos do século XVI. Martin Lloyd-Jones nos fala que entre aqueles que rejeitam a memória da Reforma temos, basicamente, dois tipos de argumentação: 1º) Dos que dizem que o passado nada tem a nos ensinar; e 2º) Dos que vêem a Reforma como uma tragédia na história religiosa da humanidade. Para os primeiros, somente o progresso científico e o futuro nos interessam. Firmadas em uma mentalidade evolucionista, estas pessoas partem para uma abordagem histórica de que o presente é sempre melhor do que o passado. Eles nada enxergam na história que possa nos servir de lição, apoio, ou alerta. Já para os segundos, devemos estudar a unidade e não um movimento que trouxe a divisão e o cisma ao cristianismo. Para eles, perdemos tempo quando nos ocupamos de algo "tão negativo".

Podemos dar graças, entretanto, pelo fato de que um segmento da Igreja ainda acha importante relembrar e aplicar as questões levantadas pelos Reformadores. Contudo, o mesmo Martin Lloyd-Jones alerta para um perigo que ainda existe no interesse pelos acontecimentos que marcaram o século XVI. Na realidade, ele nos confronta com uma forma errada e uma forma certa de relembrar o passado, do ponto de vista religioso.

A forma errada seria estudar o passado por motivos meramente históricos. Esse estudo seria semelhante à abordagem que um antiquário dedica a um objeto. Por exemplo, quando ele examina uma cadeira, não está interessado se ela é confortável, se dá para sentar-se bem nela, ou se ela cumpre adequadamente a sua função de cadeira. Basicamente, a preocupação se resume à sua idade, ao seu estado de conservação e, principalmente, a quem ela pertenceu. Isso determinará o valor daquele objeto para o antiquário e motivará o seu estudo.

Em Mateus 23:29-35 teríamos um exemplo dessa abordagem errada do passado. O trecho diz:

Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque edificais os sepulcros dos profetas, adornais os túmulos dos justos e dizeis: Se tivéssemos vivido nos dias de nossos pais, não teríamos sido seus cúmplices no sangue dos profetas! Assim, contra vós mesmos, testificais que sois filhos dos que mataram os profetas. Enchei vós, pois, a medida de vossos pais. Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno? Por isso, eis que eu vos envio profetas, sábios e escribas. A uns matareis e crucificareis; a outros açoitareis nas vossas sinagogas e perseguireis de cidade em cidade; para que sobre vós recaia todo o sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel até ao sangue de Zacarias, filho de Baraquias, a quem matastes entre o santuário e o altar.

Jesus diz que aqueles homens pagavam tributo à memória dos profetas e líderes religiosos do passado. Eles prezavam tanto a história que cuidavam dos sepulcros e os enfeitavam, proclamavam a todos que os profetas eram homens bons e nobres, e atacavam quem os havia rejeitado. Diziam eles: "se estivéssemos lá, se vivêssemos naquela época, não teríamos feito isso!" Mas Jesus não Se impressiona e os chama de hipócritas! A argumentação de Jesus é a seguinte: Se vocês se dizem admiradores dos profetas, como é que estão contra aqueles que representam os profetas e proclamam a mesma mensagem que eles proclamaram? Jesus testou a sinceridade deles pondo a descoberto a atitude que mantinham contra aqueles que pregavam a mensagem de Deus e mostra que eles próprios seriam perseguidores e assassinos dos proclamadores da mensagem dos profetas de Deus.

Esse é também o nosso teste: Alguém pode olhar para trás e louvar homens famosos, mas isso pode ser pura hipocrisia se não aceitar, no presente, aqueles que pregam a mensagem de Lutero e de Calvino. Somos mesmo admiradores da Reforma promovida por aqueles grandes profetas de Deus?

Mas existe uma forma correta de relembrar o passado. Ela pode ser deduzida não apenas por exclusão e inferência do texto anterior, mas principalmente da passagem de Hebreus 13:7-8, que diz:

Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram. Jesus Cristo, ontem e hoje, é o mesmo e o será para sempre

A maneira correta de relembrar a Reforma é, portanto, verificar a mensagem, a Palavra de Deus como foi pregada; e isso não apenas por um interesse histórico de "antiquário", mas com o bom propósito de imitar a fé ali demonstrada. Devemos observar esse evento e aqueles homens, para aprender e seguir os seus exemplos, discernindo a sua mensagem e aplicando-a aos nossos dias.

FONTE: (Publicado em O Presbiteriano Conservador na edição de Setembro/Outubro de 1997) 

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